domingo, 8 de junho de 2008

Homens


Já me passaram alguns pela vida, uns ainda cá estão outros desapareceram, alguns limitaram-se a morrer, e a outros matei-os!

Vou falar de dois, diferentes, mas ligados!

Não sou frágil, nem à dor física nem à outra. Era até capaz de dizer que resisto muito para além da norma. No entanto há uma coisa capaz de provocar brechas na minha rocha! Não entender!

Eu posso até não concordar, mas faz-me muita confusão não entender, não conseguir ver o filme todo e depois ter que tomar decisões baseada nos poucos momentos que vi. Faz-me confusão que os outros achem que não somos merecedores de poder perceber, de saber exactamente o que se passa. É como perder as rédeas à vida ou conduzir ás cegas...

Eu tinha 15 ou 16 anos quando o conheci. Ele tinha mais do dobro da minha idade e fugia de todos os padrões que eu conhecia até então. Havia ali qualquer coisa que me impulsionava a sair da carapaça. Lançou-me o desafio e eu aceitei!

Abriram-se as portas de um admirável mundo novo! E eu deixei de ser o patinho feio para passar a ser o patinho que não se preocupa em ser feio porque tem mais em que pensar! Alarguei, expandi, aprendi, partilhei, criei, renovei e deixei-me guiar por ele, naquele mundo de sonho e fantasia.

Ele ensinou-me coisas que acho que mais ninguém me conseguiria ensinar, acho que nunca usou a melhor maneira de o fazer, não havia uma melhor maneira!

Abriu-me as portas daquela que foi, até hoje, a maior paixão, pos-me palavras nas pontas dos dedos e deu-me a voz que ainda hoje tenho!

Eu elevei-o ao mais alto patamar que conhecia, transformei-o num guia espiritual, social, e depois numa mistura de idolo e amigo e professor e tantas outras coisas!

Ele fez-me sentir coisas que mais ninguém me fez sentir, deu-me tudo o que tinha e o que não tinha também! E a nossa relação durou anos...

Uma admiração mutua, o orgulho mutuo, uma aprendizagem colectiva, a partilha!

Depois a desilusão!

É engraçado, a quem não nos faz sentir nada de especial somos capazes de perdoar tudo, porque nada tem grande significado! A quem nos dá tudo, mesmo que seja num unico momento de partilha e comunhão, e nos toca de forma a que possamos roçar a felicidade, não somo capazes de perdoar!

Eu não o perdoei, e matei-o!

No mometo em que ele me desiludiu e o matei, quase no mesmo segundo, porque uma coisa gerou a outra quase automaticamente, a minha rocha rachou, porque eu não era capaz de entender!E eu fiquei doente, doente mesmo, com mais de 40 graus de febre, sem conseguir comer ou falar! Não era para menos, foi o primeiro homem que eu matei!

Aqui entra o segundo homem de quem vou falar, ele estava ali, naquele momento que eu não entendia, e sem entender foi o meu anjo da guarda!

Nunca tinha reparado nele de maneira especial, era um bom tipo, davamo-nos bem, era comum partilharmos gargalhadas, mas nunca muito mais que isto, a verdade era que quase não nos conheciamos.

Ele foi a verdadeira personificação do altruismo, tratou-me, cuidou-me e alimentou-me durante uma semana completa, como se a minha vida dependesse dos seus cuidados! Tinha problemas tão maiores que os meus, tão mais complicados, e deixou tudo de parte, enquanto a vida dele desabava ele tratava da minha, sem nenhum tipo de obrigação, só porque sim!

E eu nunca tive a oportunidade de lhe dizer o quanto o gesto dele foi importante para mim, perdi-lhe o rasto, nunca lhe pude dizer que me lembro muitas vezes das imagens daqueles dias, ele a trocar-me a roupa, encharcada em suores de delirios febris, a preparar as refeições, a dedicação e o mimo, tanto mimo, talvez eu o tenha desiludido e ele me tenha matado!

Nasceu, talvez por ironia, no dia do teatro!

São dois homens, o primeiro matei-o e depois ele fez-me o favor de morrer, o segundo desapareceu, e o que eu lamento, gostava de o encontrar, talvez agora pudesse ser eu a cuidar dele!

2 comentários:

Anónimo disse...

O pensamento também cuida por isso acredito que estejam esses homens onde estiverem ao pensares neles,os tenhas morto ou não, estarás a cuidar deles de forma subtil
Beijosssssssss

Anónimo disse...

Em relação ao segundo homem, são poucas as pessoas que realmente fazem algo assim por nós só porque sim e, se realmente o queres voltar a encontrar , seja para agradecer, retribuir ou só porque sim, não hesites. Vai e não pares, e quando o encontrares, não percas tempo, diz-lho logo antes sequer de dizeres olá. As verdadeiras segundas oportunidades são raras, algo se perde sempre na primeira, nem que seja a novidade. Boa sorte :)